Proprietários rurais das terras onde o Canal Extravasor será construído em Itaperuna, na zona rural conhecida como Limoeiro, entraram na Justiça e eis o resultado em fac-símile e depois por extenso:
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO
01ª Vara Federal de Itaperuna
Processos nos 0000187-49.2013.4.02.5112
0000188-34.2013.4.02.5112
0000189-19.2013.4.02.5112
0000203-03.2013.4.02.5112
Autor: LUIZ GONZAGA HIPÓLITO E OUTROS
Réu: UNIAO FEDERAL E OUTROS
Decisão
Trata-se de ações possessórias ajuizadas por LUIZ GONZAGA HIPÓLITO e
OUTROS, em face da UNIÃO FEDERAL, do ESTADO DO RIO DE JANEIRO e do
MUNICÍPIO DE ITAPERUNA, por meio das quais os autores pleiteiam, em sede de
liminar, a manutenção de suas posses e a determinação, aos réus, de que se abstenham
de turbá-las novamente ou esbulhá-las, sob pena de multa diária pelo descumprimento.
Narram os autores, nos 04 (quatro) processos, que são proprietários/possuidores
de diferentes glebas de terras localizadas na antiga “Fazenda do Limoeiro”, zona rural
de Itaperuna, localizada a um quilômetro, aproximadamente, do fim da área urbana
desta cidade, e que exercem a posse mansa, ininterrupta e com destinação social de suas
respectivas propriedades, por vários anos.
Narram, também, que de certo tempo para cá (início de 2012), suas posses estão
sendo turbadas por funcionários do poder público que, sem se identificarem e sem
qualquer tipo de autorização, ingressam nas propriedades rurais (inclusive com cortes de
cercas e retiradas de moirões), realizam diversos trabalhos de medição de terras,
utilizam máquinas de perfuração, analisam o solo, demarcam com tinta vermelha as
propriedades, medem o curso das águas dos ribeirões, etc.
Tais funcionários, ao serem indagados sobre o que estão fazendo, respondem
que ali será construído um extravasor, isto é, uma canal com 40 metros de largura, 8
metros de profundidade e 7 mil metros de comprimento, para servir como um ladrão de
um grande açude, já que aquelas propriedades seriam inundadas pelas águas das chuvas
nos períodos de enchentes, com o objetivo de desviar essas águas antes que cheguem à
cidade.
Segundo informam os autores, há, inclusive, um Inquérito Civil Público sendo
conduzido pela Procuradoria da República, de nº 1.30.004.000040/2012-79, no qual
também não constam o projeto ou as licenças ambientais necessárias à execução das
mencionadas obras.
Informam os autores, ainda, que os diversos agentes públicos que invadem as
suas propriedades rurais quase sempre não se identificam (embora já tenha havido um
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Processos nos 0000187-49.2013.4.02.5112
0000188-34.2013.4.02.5112
0000189-19.2013.4.02.5112
0000203-03.2013.4.02.5112
grupo que disse integrar o governo federal), e que a maior turbação é exatamente o
ingresso indiscriminado e arbitrário de pessoas sem qualquer identificação e sem as
explicações cabíveis. Relatam, ainda, que só conseguiram obter informações do que
estava realmente acontecendo na mídia eletrônica, e se veem na iminência de sofrer
esbulho com a construção do extravasor.
Por fim, asseveram que no local encontram-se casas, mananciais preservados,
mata atlântica, escola municipal em plena atividade, capela, gado de corte e de leite e
demais relíquias históricas.
A apreciação do pedido de liminar foi postergada para após a contestação dos
réus.
Os réus apresentaram suas respectivas contestações.
É o breve relato. Decido.
DA CONEXÃO:
Inicialmente, verifico que há conexão entre os processos nos 0000187-
49.2013.4.02.5112, 0000188-34.2013.4.02.5112, 0000189-19.2013.4.02.5112 e
0000203-03.2013.4.02.5112, por lhes serem comuns o objeto e a causa de pedir (art.
103 do CPC).
Na forma do que preceitua o art. 105 do CPC, havendo conexão, o juiz, de
ofício, pode ordenar a reunião de ações propostas em separado, a fim de que sejam
decididas simultaneamente. Tal reunião se dá em benefício da Justiça, já que objetiva
preservar a autoridade das decisões judiciais evitando-se soluções conflitantes,
possivelmente motivadoras do descrédito no Poder Judiciário.
Assim, RECONHEÇO a CONEXÃO e DETERMINO a reunião desses
processos.
Considerando-se que o processo nº 0000187-49.2013.4.02.5112 foi o primeiro a
ser distribuído, os demais deverão ser redistribuídos por dependência deste, na
forma do que preceitua o art. 253, inciso I, do CPC.
Portanto, remetam-se os 04 (quatro) autos à SEADI para redistribuir os
processos nos 0000188-34.2013.4.02.5112, 0000189-19.2013.4.02.5112 e 0000203-
03.2013.4.02.5112 por dependência ao processo nº 0000187-49.2013.4.02.5112.
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0000188-34.2013.4.02.5112
0000189-19.2013.4.02.5112
0000203-03.2013.4.02.5112
DO AFASTAMENTO DAS PRELIMINARES:
Afasto a preliminar de ausência de interesse de agir, arguida pelo Município
de Itaperuna, pelos motivos que passo a aduzir.
O interesse processual é condição da ação que se revela sempre que o postulante
apresenta relação de necessidade–utilidade–adequação entre sua pretensão e o meio
processual utilizado para o alcance de tal desiderato.
O interesse de agir, condição da ação, é comentado da seguinte forma pela
doutrina:
“Interesse de agir – essa condição da ação assenta-se na premissa de
que, tendo embora o Estado o interesse no exercício da jurisdição
(função indispensável para manter a paz e a ordem na sociedade),
não lhe convém acionar o aparato judiciário sem que dessa atividade
se possa extrair algum resultado útil. É preciso, pois, sob essa prisma,
que, em cada caso concreto, a prestação jurisdicional solicitada seja
necessária e adequada.
Repousa a necessidade da tutela jurisdicional na impossibilidade de
obter a satisfação do alegado direito sem a intercessão do Estado –
ou porque a parte contrária se nega a satisfazê-lo, sendo vedado ao
autor o uso da autotutela, ou porque a própria lei exige que
determinados direitos só possam ser exercidos mediante prévia
declaração judicial.”
(CINTRA-GRINOVER-DINAMARCO. Teoria Geral do Processo. 9ª
edição. São Paulo : Malheiros. 1992, p. 217-8)
No presente caso, o Município de Itaperuna afirma que a parte autora não
requereu administrativamente o direito e que por isto não há pretensão resistida. Ocorre
que o próprio réu se contradiz ao contestar a ação, pugnando pela improcedência do
pedido, donde decorre que, se pleiteado administrativamente, a parte autora veria seu
direito rechaçado.
Ademais, não há previsão legal relativa à exigência de prévio requerimento
administrativo para ajuizamento da ação judicial, inclusive porque tal exigência estaria
eivada de inconstitucionalidade, por ofensa direta ao direito fundamental de livre acesso
ao Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, CF)
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0000188-34.2013.4.02.5112
0000189-19.2013.4.02.5112
0000203-03.2013.4.02.5112
Afasto também a preliminar de inépcia da inicial, arguida pelos 03 (três)
réus, por entender que não se faz presente nenhum dos vícios elencados no art. 295,
parágrafo único, do CPC. Ao contrário do que alegado pela parte ré, os autores indicam
com clareza os fatos e fundamentos jurídicos. Ademais, o atendimento, ou não, dos
requisitos do art. 927 do CPC, é matéria a ser analisada no mérito e não na seara dos
requisitos formais da petição inicial, que continuam afetos às prescrições do art. 282 do
CPC também nas possessórias.
Afasto igualmente a preliminar de ilegitimidade passiva, também arguida
pelos 03 (três) réus, posto que: 1º) não se pode exigir do proprietário, que vê sua posse
sendo turbada por pessoas não identificadas (e que se negam a identificar-se), saber
precisamente qual agente público, de qual esfera governamental, agiu neste ou naquele
momento específico, já que, à toda evidência (pela prova até aqui colacionada), há uma
ação concertada entre os três níveis de governo para realização das “obras para
mitigação das cheias do rio Muriaé na cidade de Itaperuna”; 2º) o tão só fato de os
autores terem incluído os três réus no polo passivo, se adotada a teoria da asserção e
superada a análise inicial, pelo Juízo, de efetiva possibilidade de conduta de cada ente
nos fatos narrados, já desloca a questão para o mérito e não para a ilegitimidade.
Superadas essas preliminares, a análise agora recai sobre a possibilidade de
concessão da liminar requerida.
DA LIMINAR DE MANUTENÇÃO DA POSSE:
O Código de Processo Civil, ao tratar das ações possessórias (art. 920 e
seguintes), assim estabelece:
Art. 924. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de
posse as normas da seção seguinte, quando intentado dentro de ano e
dia da turbação ou do esbulho; passado esse prazo, será ordinário,
não perdendo, contudo, o caráter possessório.
(...)
Art. 926. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de
turbação e reintegrado no de esbulho.
Art. 927. Incumbe ao autor provar:
I - a sua posse;
Il - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III - a data da turbação ou do esbulho;
IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de
manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração.
Art. 928. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz
deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de
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0000203-03.2013.4.02.5112
manutenção ou de reintegração; no caso contrário, determinará que
o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para
comparecer à audiência que for designada.
Parágrafo único. Contra as pessoas jurídicas de direito público não
será deferida a manutenção ou a reintegração liminar sem prévia
audiência dos respectivos representantes judiciais.
(...)
No presente, as ações foram ajuizadas entre os meses de julho e agosto/2013,
sendo noticiado que os atos de turbação se iniciaram no mesmo ano (fl. 04), sem
qualquer impugnação dessa afirmação (quanto à sua anterioridade) pelos réus. Ora, se
tais atos se iniciaram no mesmo ano, e a ação fora ajuizada em julho/agosto, conclui-se
que o início da turbação não superava, na data da propositura da ação, 08 (oito) meses,
preenchendo-se assim o requisito do art. 924 do CPC (menos de ano e dia) e do inciso
III do art. 927 do CPC.
No que toca à prova da posse, os autores provaram que a exercem com a juntada
dos documentos de fls. 24, 30, 38, 48/50, 51/53, 56/58, 63/65 e 82 (no primeiro feito);
fls. 29/30, 39, 45 e 50/52 (no segundo feito); fls. 20/21, 25/27, 40/42 e 43/46 (no
terceiro feito) e fls. 29/32 e 41/43 (no quarto feito). Ademais, também não houve
impugnação por parte dos réus quanto à posse afirmada e/ou exercida pelos autores, o
que a torna igualmente incontroversa. Tenho, portanto, por atendido o inciso I do art.
927 do CPC.
Quanto à prova da turbação, os autores colacionaram as fotos de fls. 88 e 98 (no
primeiro feito), fl. 86 (no segundo feito) e fl. 52 (no terceiro feito), que demonstram as
marcações (não autorizadas) em tinta vermelha. Também juntaram as fotos de fls. 49/50
e 52/53 (no terceiro feito), que demonstram as perfurações não autorizadas feitas pelos
agentes públicos. Há, ainda, as fotos de fls. 93, 99, 100 (no primeiro feito) e 59/61 (no
segundo feito), que demonstram a catalogação não autorizada de árvores. E por fim, as
fotos de fls. 100/102 (no primeiro feito), fl. 87 (no segundo feito) e fl. 54 (no terceiro
feito), que mostram a invasão de veículos nas propriedades. Dessa forma, concluo
preenchido o requisito do inciso II do art. 927 do CPC.
Por fim, o requisito do inciso IV do art. 927 do CPC também há de ser
considerado preenchido haja vista que nenhum dos autores relata ter deixado de exercer
a posse, ainda que turbada. Além disso, todos os réus são categóricos em afirmar que
não realizaram atos de turbação ou de esbulho, o que denota não ter havido
desapossamento.
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0000203-03.2013.4.02.5112
Preenchidos, portanto, todos os requisitos exigidos pelo CPC, resta ainda
verificar se a hipótese retratada nos autos se amolda às permissões dos artigos 7º e/ou
36 do Decreto-Lei nº 3.365/41. Vejamos:
Art. 7º Declarada a utilidade pública, ficam as autoridades
administrativas autorizadas a penetrar nos prédios compreendidos
na declaração, podendo recorrer, em caso de oposição, ao auxílio de
força policial.
Art. 36. É permitida a ocupação temporária, que será indenizada,
afinal, por ação própria, de terrenos não edificados, vizinhos às
obras e necessários à sua realização.
O expropriante prestará caução, quando exigida.
Pelo que consta dos autos, nenhuma das duas permissões se encontra presente no
caso concreto, já que não há comprovação de que foi declarada a utilidade pública dos
imóveis turbados (nenhum dos 03 entes, citados, trouxe qualquer decreto
declarando a utilidade pública/expropriação). Também não há falar na ocupação
temporária do art. 36 já que esta exige “terrenos não edificados, vizinhos às obras e
necessários à sua realização”.
Ora, a conjunção aditiva “e”, utilizada pelo legislador logo após a palavra
“obras”, impõe somar os requisitos: deve haver obras em andamento (obras essas
realizadas pelo poder público após regular processo de desapropriação, tanto que o
parágrafo desse dispositivo se refere a “expropriante”), e os terrenos vizinhos a essas
obras públicas devem ser necessários à realização destas. A conjunção, repita-se, é
aditiva (e não alternativa). E mais: o terreno vizinho a essas obras, além de necessários,
devem ser “não edificados”. Ocorre que os autores comprovaram que o terreno possui
edificações, conforme de depreende da análise dos documentos de fls. 89, 91 e 95 (no
primeiro feito), fl. 63 (no segundo), fl. 47 (no terceiro) e fl. 36 (no quarto), onde se
verificam casas residenciais. Também há construções em alvenaria, currais, escola e
capela (fls. 90, 93/94, 96 – no primeiro feito -, fls. 59, 62 e 80 – no segundo -, e fl. 47 –
no terceiro feito).
Conclui-se, portanto, que não restou configurada a ocupação temporária
(regulada pelo mencionado Decreto-Lei) e não há autorização legal para a entrada
indiscriminada dos agentes públicos dos réus.
Frise-se que não há sequer a comprovação por parte dos réus de que os autores
tenham sido notificados quanto aos acessos em suas propriedades. O que se extrai dos
autos é que os demandados vêm simplesmente adentrando a propriedade alheia sem
qualquer embasamento legal para tanto e sem a necessária comunicação prévia.
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0000188-34.2013.4.02.5112
0000189-19.2013.4.02.5112
0000203-03.2013.4.02.5112
Por fim, verifico, em sede de cognição sumária/precária, que a turbação
realmente fora perpetrada pelos 03 (três) réus, conjuntamente, já que as atividades que
ali realizaram foram decorrentes de convênio firmado entre a União e o Estado do Rio
de Janeiro, para benefício do Município de Itaperuna. Os três entes federativos têm,
portanto, interesse na realização das “obras para mitigação das cheias do rio Muriaé na
cidade de Itaperuna”.
Para o que se exige neste momento processual, os documentos de fls. 154/221
(do primeiro processo, mas que se repetem em todos os demais, com outra numeração
de folhas) demonstram que há essa triangulação de ações entre os réus, já que neles se
pode verificar que:
a) Há um processo administrativo, de nº 59100.001058/2012-37, tramitando no
b) A execução dessa obra é de responsabilidade do Estado do Rio de Janeiro,
c) Foi constatado que o local da implantação das barragens no rio Muriaé é
d) O Município de Itaperuna, principal beneficiário das obras, participa das
âmbito do Ministério da Integração Nacional (União) – fl. 154;
a quem incumbe elaborar os respectivos projetos, bem como obter a
documentação necessária, dentre a qual se inclui a comprovação de
propriedade ou imissão na posse, licenciamento ambiental e outorga do
direito de uso de recursos hídricos (fl. 154);
região de fazendas, cuja desapropriação poderá retardar o andamento das
obras (e essa “constatação” confirma a vinda de agentes públicos aos
imóveis rurais dos autores) – fls. 155/158;
ações narradas nas exordiais, tanto que seu Prefeito Municipal emite
declaração de que o local objeto da intervenção é área de domínio público (e
para emitir tal declaração, necessária se faz pelo menos uma ida ao local do
projeto) – fl. 218.
Por todo o exposto, com fulcro no art. 928 do CPC e por estarem preenchidos
todos os requisitos legais, DEFIRO a LIMINAR requerida e DETERMINO a
expedição de MANDADO LIMINAR DE MANUTENÇÃO DOS AUTORES EM
SUAS RESPECTIVAS POSSES, nas glebas de terras da região da Fazenda do
Limoeiro, nesta cidade de Itaperuna, DETERMINANDO aos Réus que se abstenham,
enquanto não possuírem autorização legal para tanto, de turbar novamente a posse dos
autores, ou esbulhá-los, por qualquer meio (inclusive com o ingresso de seus
agentes/servidores/funcionários/contratados).
Fixo a multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para o caso de
descumprimento da ordem aqui emanada, a ser suportada pelo réu que a descumprir, em
favor de cada autor que sofrer nova turbação ou esbulho. Ficam os autores autorizados a
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Processos nos 0000187-49.2013.4.02.5112
0000188-34.2013.4.02.5112
0000189-19.2013.4.02.5112
0000203-03.2013.4.02.5112
chamar a força policial para fazer cessar a eventual nova turbação ou esbulho, bem
como lavrar o respectivo Boletim de Ocorrências, cuja cópia servirá de comprovação
para fins de aplicação da multa aqui fixada.
Ante a informação dos autores de haver um Inquérito Civil Público em
andamento (nº 1.30.004.000040/2012-79), dê-se vista ao Ministério Público Federal.
À SEADI para cumprir o comando inserto no último parágrafo do tópico “Da
Conexão”, acima.
P.R.I.C.
Itaperuna/RJ, 19 de fevereiro de 2014
Assinado eletronicamente
MAURÍCIO MAGALHÃES LAMHA
Juiz Federal Substituto
-------------------------------------------------------------------------------------------------
DEPOIMENTO AO ninoblogbellieny FEITO POR UMA PROPRIETÁRIA DE TERRAS NA ÁREA A SER ATINGIDA PELO CANAL
Prezado Nino,
Trata-se de um projeto realizado pela União, Estado do Rio de Janeiro e Prefeitura de
Itaperuna, que decidiram que a construção de um extravasor será a melhor maneira de se
retirar as enchentes de Itaperuna, embora diversos outros projetos existam com o mesmo
objetivo.
Inicialmente, importante destacar que ninguém é contra minorar-se os efeitos das cheias do
Rio Muriaé. Contudo, num Estado Democrático de Direito até mesmo o poder público tem que
cumprir as leis, o que não vem ocorrendo desde o início desse projeto.
Nos meados de 2013, todos os proprietários da antiga Fazenda do Limoeiro começaram a
observar pessoas em carros descaracterizados fazendo vários tipos de medições na estrada
(RJ 116). Logo em seguida começaram a invadir as propriedades sem qualquer autorização,
cortar cercas, catalogar árvores etc. e quando advertidos, respondiam que eram “agentes
do governo” e para “não criarmos caso, pois ali tudo seria invadido pelas águas”, ou seja, os
proprietários eram ameaçados dentro de suas terras produtivas, sem saberem o motivo.
Até que o Sr. Hipólito, proprietário rural da localidade, impediu o ingresso de alguns deles e
resultou num Registro de Ocorrência lavrado na Delegacia de Itaperuna, ante as inúmeras
ameaças sofridas e danos causados.
A irresponsabilidade desses “agentes governamentais” foi tão grave que cortaram cercas ao
lado de uma escola municipal em plena atividade, colocando todas as crianças, professores e
as demais pessoas que trafegam na Rodovia expostos aos animais de grande porte e por sorte,
não aconteceu uma fatalidade.
Assim, alguns dos proprietários ingressaram com uma ação judicial de manutenção de posse,
pedindo ao Juiz que impedisse o acesso indiscriminado desses agentes em suas respectivas
propriedades, pois estavam colocando todos em risco, além de ser uma conduta totalmente
arbitrária e ilegal, sem qualquer precedente na Constituição Federal.
Aliás, puxando pela memória, o único precedente histórico existente, foi quando da chegada
da Família Real ao Brasil/Colônia, por ausência de moradias para os nobres, as pessoas que
aqui viviam foram expulsas de suas casas, sem qualquer aviso ou indenização.
Tal ação, em decisão de extremo brilhantismo do Juízo da Vara Federal de Itaperuna,
garantiu aos proprietários a posse de suas terras, sob pena de multa moratória por dia de
descumprimento, além do uso de força policial se qualquer agente governamental, seja da
União, Estado e Município, adentrar as terras da antiga fazenda do Limoeiro.
Estranhamente, ignorando a decisão judicial, sem realização de qualquer estudo ambiental,
sem qualquer licença ambiental, sem audiência pública, sem conhecimento de qualquer
cidadão Itaperunense e sem cumprir as determinações descritas nas leis, a empresa Odebrech,
iniciou as obras de construção do mencionado extravasor.
Ao conhecer melhor o projeto através do engenheiro da empresa citada, embora o Estado e a
Prefeitura afirmem em suas contestações perante o Juízo a inexistência de qualquer obra na
Região, verifiquei que o mencionado extravasor terá início logo após o perímetro urbano, e
será construída uma barragem na rodovia que será bloqueada, além de um desvio grandioso
para que as pessoas possam novamente ter acesso a BR 116, que liga Itaperuna a Miracema
(acesso a Itajara, 3° distrito de Itaperuna) e tomará toda a planície em torno da antiga Fazenda
do Limoeiro, com águas de enchentes que chegarão a 74 metros cúbicos de sujeiras (ou
aproximadamente, 14 maracanãs de águas de enchentes).
E pior, o que acontecerá com a fauna e a flora da região? Ali há um berçário natural de garças,
visível em qualquer margem do Rio Muriaé! E os demais animais? E a mata atlântica? E as
relíquias históricas? ( Ainda existe o cemitério dos escravos, o cemitério dos nobres feudais,
conservado unicamente pelos proprietários das terras, além de diversas relíquias do período
escravocrata). E a antiga Capela em homenagem a Santa Luzia em plena atividade? E a escola,
como funcionará já que a barreira cortará a estrada que lhe dá acesso? E as pessoas que lá
residem e trabalham, terão que fugir de suas casas? E seus animais? E a maior bacia leiteira de
Itaperuna?
Existem, portanto, direitos transindividuais que ultrapassam os valores econômicos a serem
considerados, que não podem ser ignorados pelo Poder Público, fazendo que uma tragédia
como as enchentes justifiquem todo tipo de arbitrariedade!
Acrescenta-se a isso o fato da fazenda do Limoeiro ser uma das primeiras relíquias de
Itaperuna, descritas em todos os livros que contam a história da cidade, além de já ter sido o
“cartão postal da cidade”, utilizado pelos Correios.
E mais, quais os tipos de doenças poderão ser transmitidas as pessoas ao represar quantidade
tão grande de águas de enchentes? Vale lembrar que tal obra se dará a um quilômetro do
fim do perímetro urbano e aproximadamente dois quilômetros do centro da cidade, sendo
certo que embora considerada área rural, diversas pessoas lá residem, havendo densidade
populacional considerável.
E a produção econômica de tal região? Poderão os animais serem contaminados pelas
inúmeras doenças que vêem junto às enchentes? Onde estão os laudos técnicos para
realização de tal projeto? Por que escolher uma área tão próxima a cidade já que todo o
município é cortado pelo Rio? Por que inundar uma área que jamais sofreu com os impactos
das cheias? Logo, existem planícies mais propícias a realização do projeto que sequer foram
avaliadas! Por que não escolher outro projeto de menor custo ambiental? A Primeira Câmara
Republicana do País aprovou esta lástima? Receberemos somente as águas do Rio Muriaé ou
também seremos contaminados pelas cheias dos Rios de Minas Gerais?
Nem considere a absurda alegação que a barragem só será utilizada quando se chegar ao
nível tal e tal ..... que estatísticamente ocorreu somente nos últimos 25 anos! Isso seria uma
aberração, pois não se faz obra pública, com o dinheiro público, para ser utilizada de 25 a 25
anos! Certo que será utilizada todos os anos, durante o período das cheias e, provavelmente,
como os rios são divididos em bacias, sem divisões “por Estado”, seremos contaminados pelas
doenças que vêm das enchentes de diversos lugares, com águas estagnadas no extravasor!
Assim, aqueles que sofrem os efeitos das enchentes, além de perderem seus bens agora
perderão sua saúde, pois toda a cidade estará sujeita a transmissões de doenças como a
leptospirose, dengue etc., já que o extravasor represará por um largo período as águas
poluídas das enchentes que antes “corriam” e inundavam por alguns dias a cidade.
Embora torcendo por dias melhores, custo crer que haverá algum benefício para a região com
tal projeto faraônico, sendo certo que as autoridades responsáveis não devem aceitar tal obra
como solução dos problemas das cheias, eis que efetivamente não o é, bastando uma pequena
análise para se chegar as mesmas constatações que fiz.
Rossana Bussade Macedo Bastos.
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